Os primeiros “bips” ouviram-se há exatamente 30 anos nas caixas registadoras de um hipermercado. O código de barras tornou-se numa tecnologia indispensável mas no início houve resistência: tornava as embalagens feias.
José Antônio Rousseau tinha 25 anos quando Figueiredo Vasco, na altura presidente da Associação Nacional de Supermercados (ANS), lhe chamou “sonhador”. No início dos anos 1980, Portugal ainda não tinha grandes cadeias de supermercados, estava a acordar para o consumo de massas, e nas prateleiras não havia, nem de perto, nem de longe, os 70 mil produtos diferentes que, hoje, chegam a estar à venda num hipermercado. O secretário-geral da então ANS, hoje transformada na gigante Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED) estava ainda aprendendo tudo sobre o setor.
“Era um recém-entrado no mundo da distribuição e uma das primeiras coisas que fiz foi assinar a revista francesa Libre Service Actualités (LSA), que recebia todas as semanas para saber o que se passava na área”, conta José Rousseau, que hoje é consultor e presidente do Fórum do Consumo. Numa dessas edições, um artigo falava sobre um sistema que atribuía códigos de barras às empresas, “para que os seus produtos passassem nas caixas registadoras”. “Lendo o código, a operação era mais fluída e cada produto era abatido imediatamente do estoque. Isso era um sonho. Nós colocávamos os preços um a um”, recorda.
Era com uma espécie de pistola que disparava etiquetas autocolantes nos produtos, que colavam os preços. Não havia leitores de infravermelhos e nos caixas, os operadores registavam os valores nas máquinas registadoras, numa velocidade aprimorada pela experiência. A margem de erro era grande. “Uma vez por ano fazia-se o inventário físico, uma contagem unidade a unidade”, descreve.
João de Castro Guimarães, que fez carreira na Nestlé e é hoje o diretor executivo da GS1 Portugal, (a associação que gere o sistema de código de barras no país), diz que “ou havia muito estoque ou rupturas” nas lojas. “Estamos falando, sobretudo, de mercearias. Os produtos eram anotados naqueles característicos livros estreitos”, continua o gestor.
Depois de ler o tal artigo na revista francesa, José Rousseau levou o tema à direção da ANS e propôs a criação de uma estrutura em Portugal que arrancasse com um sistema de codificação. “Ao meu lado, Figueiredo Vasco, que representava o Pão de Açúcar, deu-me duas palmadinhas nas costas e me disse: ‘O senhor é um sonhador, mas avance, avance’. E eu avancei”. Nos anos seguintes, Rousseau fez um trabalho de pesquisa e contatos. Conseguiu reunir apoios e em 26 de Novembro de 1986 nasceu a Codipor, Associação Portuguesa de Identificação e Codificação de Produtos, com a Nestlé e a Supa (Companhia Portuguesa de Supermercados, dona do Pão de Açúcar, hoje da Auchan) no núcleo fundador. A estas juntaram-se os Armazéns da Matinha e A Favorita, Indústria Agro-Alimentar (ambas já desaparecidas), a Macieira, a Sogrape, a Supermercados Modelo, a Forrester, a Tudor e a Indústrias Lever Portuguesa. O código de barras em Portugal surgia, assim, dez anos depois de ter sido lançado nos Estados Unidos.
Para colocar o projeto em marcha foi preciso investir nos leitores ópticos, adotar máquinas e formas de trabalhar. Nem todas as portas se abriram. “A principal dificuldade foi convencer os industriais a aderir. Argumentavam que o código de barras iria tornar a embalagem mais feia, o que não fazia sentido. Pouco a pouco, foi-se conseguindo”.
Mas o empurrão decisivo foi feito com um ultimato. “Na verdade, o que definitivamente convenceu a indústria foi uma carta que o Continente [que abriu o primeiro hipermercado do país em 1985, em Matosinhos] e o Pão de Açúcar enviaram aos fornecedores dando-lhes um prazo para codificar. Passado esse prazo, as empresas teriam de retirar produtos”. A estratégia resultou. E hoje “ninguém duvida da importância do código de barras”.
João de Castro Guimarães diz mesmo que foi a “primeiro grande passo” do setor “porque alterou toda a gestão da cadeia de abastecimento”. Permitiu controlar a quantidade de produtos armazenados, evitando desperdício, e reduzir os erros cometidos no registo dos preços.
Naquelas linhas pretas paralelas, de diferentes espessuras e uma sequência de números é possível codificar automaticamente produtos. Um leitor de código de barras emite um feixe de luz, uma linha vermelha que é reflectida nos espaços brancos e absorvida pelas barras pretas. O leitor interpreta a sequência de 13 números (o código mais comum, atribuído pela GS1): os três primeiros indicam o país em que a marca foi registada (560 se for em Portugal, o que não significa que o produto tenha sido fabricado em território nacional). Os quatro seguintes referem-se à empresa, os restantes cinco são a referência do produto e o último é um dígito de controle.
*Matéria traduzida do portal “Publico”, de Portugal.
Disponível em: http://www.publico.pt/economia/noticia/o-codigo-de-barras-ainda-nao-perdeu-validade-1715607
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